17 de Novembro de 2022 a 11 de Março de 2023 / Casa Gal, Belo Horizonte / MG

GAL apresenta Ludíbrio, exposição individual da artista Maria Palmeiro.

LUDÍBRIO

Derivada do verbete “ludus”, plural de “ludi” em latim, a palavra ludibrium, em sua etimologia, remete ao ato de brincar, àquilo que é objeto de diversão e, ao mesmo tempo, de ironia.

Nesta exposição, a produção artística de Maria Palmeiro nos anuncia diferentes variações estéticas acerca da ilusão ótica de imagens ludibriadas. Uma proposta curatorial que enreda a experiência ilusória da visão humana por um conjunto de obras produzidas por Maria entre 2018 e 2022 cujos sentidos nos revelam alternâncias dicotômicas entre o objeto e a coisa.

A artista está presente, performance à beira mar. Na areia da praia, em sua simultaneidade imagética, belos horizontes são conduzidos e perseguidos pela insistência do olhar. Em sua forma afronhada, a série Belo Horizonte ensaca sonhos no ensejo de ludibriar a realidade, capturas de um cotidiano farsesco, assim como se observa os reflexos de um cometa em movimento nas superfícies de uma casa.

Na pintura, a repetição das esferas ora assume a noção de volume em movimento, ora questiona a linha intermediária das cores. Brilho – aqui, leia-se brio – é cor que cresce sobre as paredes, uma observação do comportamento contínuo da luz. Será magia, feitiço ou imersão caleidoscópica? Taumatrópio em movimento, dobraduras de tecidos que não tem começo e nem fim. Para a artista, em sua experimentação técnica “a dobra é um modo de trabalho em que a obra deixa de ter uma origem, um suporte de acumulações”… persistindo, dessa forma, na ambiguidade da imagem, entre o que é e não é.

A fotografia é ficcionada ao manipular o espelhamento de espaços vazios de uma mesa em que os recortes são sobrepostos por objetos alusivos de um ambiente doméstico, reincidência temporal de um jogo de espelhos. Já na série Mesas, sustentadas por varas disformes, a transição entre a pintura e objeto é causada por sua disposição não convencional no espaço, uma vez que a obra requisita a parede e o chão como superfícies de apoio para sua sustentação.

Interdita em seu universo de criação pelo recolhimento social imposto à todos nós desde março de 2020, em decorrência da proliferação de organismos ainda não visíveis a olho nu, na série desenhos de quarentena, Maria parece representar a anatomia de esferas oculares, como uma tentativa de tornar visível o que se perdeu na escuridão dos dias, por vezes acinzentados, de um cenário pandêmico.

Por outro lado, na série ciência amadora, a mesma pinta composições disformes e densas de cores a partir do repertório investigativo de pesquisadores de diferentes campos do conhecimento. A artista nos situa: “o que fiz foi tornar os objetos de pesquisa presentes em mim, evidenciando um processo que se dá entre pensamento e assimilação de uma teoria e sua visualização e tradução na práxis da pintura”. Processo que se revela antropofágico em sua natureza de assimilação e produção mútua do conhecimento, alertando-nos acerca do ato estético enquanto rigor científico e a arte como objeto contestador das verdades absolutas.

Em seu figurativismo, à maneira como são desenhadas, as ameixas são risonhas pelo brio excessivo de sua voluptuosidade, ou talvez a representação do fruto em seu enquadramento erótico. As lantejoulas e a vara de led presentes na obra certamente brilhar é atraente e convincente, remontam artifícios de uma planta carnívora no desejo de capturar mariposas que sobrevoam com seus telescópios em busca de um ponto luminoso. Fiat lux: miçangas envoltas em um fósforo incendiário.

Assim, pouco a pouco, Ludíbrio se transforma em uma experiência relacional entre corpo, espaço e objetos-trecos-troços-coisas-afetos. Um jogo cênico de captura de imagens em constante movimento, transcendendo a natureza física dos objetos e transmutando o nosso olhar ao redor das coisas.

Curadoria e texto crítico: Lucas de Vasconcellos

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